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Cine Clube da Neca

Voltei a ter DVD. A Neca se puxou, tirou do arquivo o velho Sony e instalou na TV da sala. Tudo porque fiquei sem o aplicativo que me permitia espelhar o smartphone na telona. Um bug mundial mas o meu não voltou mais. Tevê moderna e smart somente no quarto, mas é na sala que gosto de ver filmes e também de usar internet quando trabalho no meu notebook, o sinal é mais forte. Bem, agora me sinto um pinto no lixo, pois vou rever os clássicos que nunca deixo de gostar, começo hoje com Amélie Poulain e sigo com outras preciosidades que a Neca, sempre ela, guardou com todo carinho. Mesmo recuperando meu Chromecast não vou mais desinstalar o DVD, cansei dos filmes previsíveis da Netflix e não tenho recursos para assinar vários streamings para catar meia dúzia de bons filmes. Me contento com as obras incríveis das últimas cinco décadas e assim fujo um pouco da atualidade que anda chata e carregada de maus presságios. Como dizia o Nei Lisboa nos bons tempos: "pra viajar no cosmos não preci...

Eu, Papa Francisco e Albert Camus.

Neca e eu passávamos uma semana em Buenos Aires quando Jorge Bergólio foi eleito Papa Francisco uns dias antes. Era o assunto na cidade inteira. No restaurante, na feira de rua, nos cafés e até nos cemitérios. E o taxista folgado que nos levava até a Feira de San Telmo: - Cómo usted se siente depués que Dieguito superó a Pelé, ahora habrá que rezarle a un Papa Argentino? - Menos mal que sou agnóstico e nunca gostei de futebol. Risadas gerais, afinal como debater com um portenho possuído por tanta emoção. Doze anos se passaram, nunca mais estive na encantadora Buenos Aires e o Papa Francisco luta para seguir sua missão, mas vê São Pedro abrindo aquela porta famosa e o convidando a entrar. Aprendi a gostar e admirar este jesuíta carismático, inteligente, bem humorado e líder reformador do pontificado. Neste meio tempo realmente me tornei agnóstico, ou seja acho difícil crer em Deus mas não nego a possibilidade de que exista. Passei para o time dos existencialistas quando descobri o almof...

Ainda Estou Aqui

Com minhas desculpas ao Marcelo Rubens Paiva e ao Walter Salles, me utilizo do título do livro/filme tão em pauta nestes dias que antecedem a entrega do Oscar, para marcar meu retorno à rotina de escrever no meu blog. Foi difícil voltar. A poeira cobriu tudo com grossas camadas e para deixar o ambiente limpo, arejado e propício para este retorno foi preciso uma determinação férrea e uma coerência refletida, qual seja a de retomar o antigo blog e seguir a partir dele, porque o hiato de tempo sumido foi grande, parecia definitivo mas não foi e, ao retomar as crônicas quero preservar o que eu já havia feito. Os tempos mudaram, eu mudei em muitos aspectos, mas ainda sou a mesma pessoa, esta é a coerência que desejo preservar. A grande novidade é que neste ínterim, eu envelheci, não como metáfora mas como fato da vida. Escrevi minhas últimas crônicas aos cinquenta e poucos anos, retorno agora já bem próximo dos setenta, antes em plena atividade profissional e morando em Porto Alegre, agora ...

Chamem David!

Afora ser um dos maiores talentos da pintura francesa de todos os tempos, Jacques Louis David foi sem dúvida o de maior presença nos eventos que mexeram com a vida dos franceses entre a Revolução Francesa e o Império de Napoleão Bonaparte. Um talento que sobreviveu ao seu tempo, mas sob um crivo mais severo: um artista chapa branca. Capaz de aderir a qualquer governo ou ideologia. David retratou as batalhas e símbolos dos anos de afirmação da Revolução Francesa, tão importante que quando alguma coisa espetacular estava por acontecer e merecia um registro pictórico, alguém do núcleo de Robespierre bradava: “chamem David!”. Retratou a morte de Jean Marat de forma esplêndida e, de um jeito que só ele sabia fazer, escapou da guilhotina quando seu protetor Robespierre foi condenado. Caiu nas graças de Napoleão e virou o pintor oficial do novo imperador. Seguiu sendo o pintor oficial da França até que Luís XVIII, irmão do decapitado Luís XVI, assumiu o comando da nação após o e...

Flanando

Paris a pé. Nada mais natural do que andar a pé na capital francesa, tanto que eles criaram uma palavra para o praticante desta modalidade de deslocamento, o flâneur. A cidade histórica tem um diâmetro aproximado de 11 quilômetros, sendo um pouco mais longa no sentido leste/oeste e um pouco mais curta na direção sul/norte. Para quem chega pela primeira vez o que tira o fôlego não são as distâncias, mas a beleza que está em qualquer ponto para onde se dirija o olhar. Caminhar em Paris é como estar dentro de uma obra de arte arquitetônica sem similares, pois não se trata de um bairro que preserva as características de 200 anos ou mais, é uma cidade inteira. O traçado principal do fluxo de automóveis e dos quarteirões habitacionais ainda é o mesmo legado por Napoleão III e o Barão Hausmann no tempo das carruagens, afora isso existem vias ainda mais antigas, medievais. Tudo com um suporte poderoso de tecnologias que tratam esgotos e canalizam redes elétricas, telefônicas e gás. ...

O bosque dos imortais.

Há quem goste de explorar cemitérios históricos, eu inclusive. O Père Lachaise é, provavelmente, o campo santo [sempre gostei desta expressão para designar cemitério] mais famoso do mundo e aquele que concentra a maioria de grandes nomes desde o Século XIX até os dias de hoje. Fica a leste de Paris, no 20º arrondissement, com várias estações de metrô nas suas imediações, ou aproximadamente 50 minutos de caminhada partindo do marco zero da cidade, na Île de la Cité, em frente da Catedral Notre-Dame. Bem verdade que ele tem um concorrente importante do outro lado do Rio Sena, o Cemitério de Montparnasse, onde ficam os túmulos de Jean Paul Sartre, Simone de Beauvoir, Charles Baudelaire, Marguerite Duras e Serge Gainsbourg, entre outros. Mesmo assim, o plantel do Père Lachaise é imbatível. Caminhando pelas suas alamedas arborizadas e adentrando nos seus caminhos mais íntimos, o visitante vai se deparando com a morada eterna de gente como Chopin, Balzac, Proust, Delacroix, Apo...

República do Marais

Passei minha vida administrando muito pouco dinheiro, quando não à beira da mais pura dureza, portanto nunca projetei muitas viagens que não fossem terrestres. Conheço pessoas que amam viajar, quanto mais melhor, e para lugares bem diversos dentro do país ou ao redor do planeta. São descolados, aventureiros e até esportistas, gente que habita aeroportos e hotéis nos quatro cantos do mundo. Muitos viajam por razões profissionais, de forma mais ou menos frequente, enfim é um povo acostumado às viagens, aos diversos climas e fuso-horários. No meu caso, toda viagem é uma tortura que inicia à medida que sua data aproxima. Sou entocado, gosto de ficar em casa e sair de automóvel por perto para voltar logo.  Detesto voar. Sem falar nas esperas em aeroportos. Mas se o destino for Paris, gasto meu último tostão e suporto tudo com resignação. Nos últimos cinco anos, por 17 dias anuais, o bairro do Marais é meu lar em Paris. Isto é simplesmente mágico, o velho casario da Rue Charl...