A
morte levou meu pai no auge da sua juventude, tinha 33 anos quando foi vitimado
por uma leucemia severa, impedindo que acompanhasse o crescimento dos filhos,
eu com dois anos e meio e meu irmão com pouco mais de um ano.
Para
compensar, a vida me deu duas mães.
Lorita,
minha mãe biológica, lutadora incansável que sempre superou suas limitações
financeiras para dar uma vida decente e um futuro melhor para seus filhos e
netos.
E
Zenóbia, minha sogra, que por quase três décadas morou comigo e minha esposa,
uma convivência rica e tumultuada, provando que algumas pessoas têm uma forma
rara de afinidade natural, capaz de transformar rusgas em cumplicidade.
Em
2013, as matriarcas da minha vida entraram em colapso, sendo internadas em
residenciais para idosos quase ao mesmo tempo.
Lorita
em Gramado e Zenóbia em Porto Alegre.
Minha
mãe, embora mais jovem, 77 anos, atingiu um estágio avançado e terminal do Mal
de Parkinson, aprisionada em uma cadeira de rodas, necessita de cuidados para
se alimentar e fazer sua higiene pessoal, 24 horas por dia.
Zê,
apelido para amenizar o nome esquisito da minha sogra, tem 92 anos e a saúde
bastante boa, afora sua artrite reumatóide e momentos de senilidade que começam
a sinalizar o declínio da sua notável lucidez.
Transposto
o impacto inicial de aceitar a terceirização dos cuidados com pessoas tão
próximas e dando graças a Deus por encontrar lugares razoavelmente decentes e
que os orçamentos familiares podem pagar, minha mulher e eu estamos formando um
novo círculo de convivência com os internos e funcionários dos residenciais.
Por
força da distância, vejo mais assiduamente a Zê do que minha mãe, mesmo assim
dou um jeito de subir a serra por duas ou três vezes cada mês.
Entre
os internos de lá e daqui tem de tudo, gente que se internou voluntariamente,
outros que os familiares deixaram e nunca mais apareceram, gente doente, gente
sã e muitos “bilés”, inclusive jovens.
Ao
primeiro olhar é um cenário deprimente, mas à medida que se convive com o lugar
e as pessoas, surgem luzes e sinais de vida inteligente, embora triste, é um
espaço que dá a medida exata da era em que vivemos.
A
longevidade que conquistamos tende a nos conduzir para esta experiência.
Poucos
serão os privilegiados que terão estrutura financeira e, principalmente,
emocional para viver todos os seus dias dentro do contexto familiar.
Paradoxalmente
quando os recursos eram menores e as famílias muito maiores, isto era natural,
mas os tempos do consumo exacerbado e do individualismo visceral nos
transformaram em seres descartáveis.
Triste
esta última jornada, tanto para quem está partindo quanto para quem fica.
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Parabéns