Pular para o conteúdo principal

Se eu ganhar na Megasena

Quem aprecia o gênero comédia de erros vai se interessar por este artigo.
Há um mês reduzi a minha aposta básica na Megasena de seis para três jogos, apenas um jeito de continuar sonhando com os bafejos da fortuna em um investimento mais modesto.
Também decidi fazer a aposta automática para duas extrações seguidas, evitando passar na agência lotérica mais de uma vez por semana.
Até aí tudo bem, pois continuei muito longe de acertar as seis dezenas.
Vai que amanhã, dia 04 de setembro de 2010, haverá o sorteio de um prêmio na faixa de 80 milhões de reais, bem mais do que preciso para realizar meus sonhos mais extravagantes.
Como este valor é resultante de vários prêmios acumulados, fiz minha teimosinha (duas extrações seguidas) antes do sorteio da última quarta-feira.
Na manhã de quinta, abri o jornal na página das extrações lotéricas e conferi meu comprovante mais os jogos da minha mulher. Automaticamente joguei os papéis no lixo do escritório e segui nas lidas do dia.
No intervalo do almoço, em casa, me dei conta do que havia feito e ao retornar fiz uma blitz nos cestos de papel da firma e, bingo, lá estava meu comprovante de aposta bem amassadinho, mas sem nenhum rasgo.
Diligentemente, com ajuda de uma régua, estiquei todo o papel que ficou com aspecto de mosaico de cerâmica. Guardei dentro de um livro bem volumoso e levei comigo. À noite peguei o ferro de passar roupa e, com todo cuidado, coloquei o bilhete entre duas folhas brancas, dei aquela pressionada necessária para deixá-lo lisinho e revitalizado. Quando retirei as folhas de proteção vi com perplexidade que o lado em que se viam os números apostados simplesmente mudara de cor, de branco para preto total. Meu Deus! Serei o único idiota a desconhecer que o tal papel é térmico e reage ao calor, perdendo completamente os caracteres impressos?
Bem que minha esposa advertiu “não passa”, mas na falta de uma justificativa para esta restrição segui com minhas convicções.

Hoje voltei na agência lotérica, milagrosamente vazia. Meio sem jeito, expliquei minha desventura à atendente para saber se havia esperança de obter uma segunda via da aposta anterior (vejam o ponto em que um ser humano pode chegar), mostrando meu desafortunado bilhete para ela e mentindo que fora culpa da minha sogra, que passara minha calça com o bilhete dentro do bolso. Claro que não havia como obter uma cópia.
Em trinta segundos todos os funcionários ficaram sabendo, provavelmente tudo foi registrado pelas câmeras de segurança. Foi um momento de risos generalizados. Aí um rapaz, que imagino ser o gerente me explicou que se este bilhete vier a ser premiado eu terei que solicitar uma perícia junto a Caixa Federal (rs) porque o verso está preservado, incluindo o número da operação impresso na hora da aposta. Ou seja, ao invés de milionário eu passaria à condição de reclamante do prêmio, aí não dá para prever o resultado nem quanto tempo de espera pela decisão final.
Portanto apostei novamente os mesmos números, na “melhor” das hipóteses corro o risco (improvável) de acertar sozinho e levar metade do prêmio. Afinal haverá outra aposta ganhadora.
Depois é outra história. Com dinheiro, o comprovante (sinistrado) da outra aposta e o advogado certo, pagarei para ver se o sistema estatal de apostas será capaz de homologar a outra fração da minha fortuna.

Por via das dúvidas, será justamente esta a parcela que reservarei para fazer doações.

Comentários

Mr.Milk disse…
Muito bem, dos males o menor, e neste caso o menor pode ser bem grande. Acho que tua sogra nem vai reclamar da mentira. Talvez tenha ficado até orgulhosa.

Postagens mais visitadas deste blog

Chamem David!

Afora ser um dos maiores talentos da pintura francesa de todos os tempos, Jacques Louis David foi sem dúvida o de maior presença nos eventos que mexeram com a vida dos franceses entre a Revolução Francesa e o Império de Napoleão Bonaparte. Um talento que sobreviveu ao seu tempo, mas sob um crivo mais severo: um artista chapa branca. Capaz de aderir a qualquer governo ou ideologia. David retratou as batalhas e símbolos dos anos de afirmação da Revolução Francesa, tão importante que quando alguma coisa espetacular estava por acontecer e merecia um registro pictórico, alguém do núcleo de Robespierre bradava: “chamem David!”. Retratou a morte de Jean Marat de forma esplêndida e, de um jeito que só ele sabia fazer, escapou da guilhotina quando seu protetor Robespierre foi condenado. Caiu nas graças de Napoleão e virou o pintor oficial do novo imperador. Seguiu sendo o pintor oficial da França até que Luís XVIII, irmão do decapitado Luís XVI, assumiu o comando da nação após o e

Só falta você

Ê-ê-ê-ê, só falta você, capricha no samba pra gente vencer! Este era o refrão do samba enredo que o último bloco de carnaval do qual fiz parte, nos meus tempos de juventude e solteirice na cidade de Canela, levou para a competição de blocos do Clube Serrano. O tema escolhido foi Luzes da Ribalta, uma homenagem a Charles Chaplin, eu fui incumbido dos desenhos das alegorias e estandartes, além de atuar como Carlitos em uma cena especialmente feita para a apresentação no clube. Por algum motivo acho que exagerei na dramaticidade, era uma cena inspirada no filme O Garoto, interpretado pelo Paulo Rizzo, pois quando encerramos a performance (que incluía um violinista tocando Smile enquanto a bateria permanecia em silêncio), irromperam os aplausos mas as pessoas choravam copiosamente. Acho que ganhamos o prêmio de criatividade e inovação, mas foi o fim da minha vida de momo. Antes participei de um bloco chamado Inimigos do Ritmo, que assumidamente não era lá estas coisas com ritmo e mar

República do Marais

Passei minha vida administrando muito pouco dinheiro, quando não à beira da mais pura dureza, portanto nunca projetei muitas viagens que não fossem terrestres. Conheço pessoas que amam viajar, quanto mais melhor, e para lugares bem diversos dentro do país ou ao redor do planeta. São descolados, aventureiros e até esportistas, gente que habita aeroportos e hotéis nos quatro cantos do mundo. Muitos viajam por razões profissionais, de forma mais ou menos frequente, enfim é um povo acostumado às viagens, aos diversos climas e fuso-horários. No meu caso, toda viagem é uma tortura que inicia à medida que sua data aproxima. Sou entocado, gosto de ficar em casa e sair de automóvel por perto para voltar logo.  Detesto voar. Sem falar nas esperas em aeroportos. Mas se o destino for Paris, gasto meu último tostão e suporto tudo com resignação. Nos últimos cinco anos, por 17 dias anuais, o bairro do Marais é meu lar em Paris. Isto é simplesmente mágico, o velho casario da Rue Charlot,