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Rincões

Curiosos os nossos vínculos com os lugares onde vivemos e nos relacionamos.
Eu por exemplo, sou canelense de berço, porto-alegrense por livre escolha e, de uns tempos para cá, esteiense por empatia com o lugar.
Me dei conta da conexão com Esteio um dia destes quando, ao cruzar a ponte depois da Refap, tive aquela sensação confortante de estar chegando em casa.
Bem que poderia ser apenas o alívio de ter abandonado a BR-116 e estar trafegando por uma via mais tranqüila, mas era um sentimento mais assemelhado ao que tenho cada vez que, vencendo os limites de Gramado, adentro à bela paisagem de Canela.
Minha identificação com Esteio surgiu na breve experiência de trabalho que, por três meses, pude vivenciar como integrante da administração pública municipal.
Recebi um acolhimento extremamente caloroso das pessoas com quem convivi neste período, de todas as hierarquias e nos diferentes partidos políticos.
Esta minha inédita atuação no meio político governamental, apesar do pouco tempo, me ensinou que administrar uma cidade é tarefa das mais complexas que existem.
Tão complexa que preferi voltar ao conforto da minha atividade publicitária.
Conheci a cidade através de perspectivas diversas, às vezes, opostas, mas o que vi despertou a minha admiração por Esteio, um município de território exíguo, com uma grande concentração humana, bem próximo de Porto Alegre e, paradoxalmente, com aquele temperamento típico de cidade interiorana.
Esta é uma qualidade maravilhosa que muitas cidades e tantos países vêm perdendo.
As facilidades de comunicação estão deixando o mundo inteiro parecido demais.
Em Esteio a personalidade local ainda está viva, cheia de idéias, divergências e até de convergências, mas o assunto é sempre local e intransferível.
Nesta Semana Farroupilha, quando espíritos de maragatos e chimangos seguem sem guerrear ao lado das tantas tropas que reverenciam a história, nossos rincões ganham um sentido especial em nossos corações e mentes.
Vejo em Esteio muito do que gostaria de ver mais por este Brasil afora, as pessoas identificadas com a sua cidade e dispostas ao debate por suas convicções e idéias,
imprimindo valor e significância à cidadania.
No meu caso, a vida me levou a Porto Alegre, uma cidade grande demais e agitada demais para os padrões canelenses que desembarcaram comigo daquele ônibus, lá nos anos setenta. Detestei a capital poluída, barulhenta, perigosa e com a pior água que eu jamais provara.
O tempo passou, encontrei meu espaço profissional, casei, fiz amigos, sigo no meu cotidiano e, às vezes, vou à Canela, mato a saudade da água saborosa e do ar puro, grandes riquezas da minha juventude.
No retorno, quase sempre à noite, quando avisto a malha iluminada e colorida que desemboca em Porto Alegre, do alto de Morro Reuter, me vem a certeza de estar a caminho do lar que me adotou.
As diferenças que um dia me chocaram foram assimiladas e eu próprio, absorvido.
Então vou pra Porto Alegre. Tchau!

Comentários

Anônimo disse…
Olha só isso agora! Me recordei imediatamente de um "parágrafo" dito por uma pessoa que jamais sairá da nossa lembrança e cujo conteúdo se encontra gravado em vídeo "ad eternum": "... convidei o Juarez para trabalhar na agência como contato, mas depois vi que ele escrevia bem...melhor que eu... então me resignei e coloquei ele como redator!" (Palavras do velho e sábio Benício).
Passaram-se anos, nosso Benício - (digo nosso por força de expressão!) - já não se encontra mais presente e qual não foi minha surpresa ao ler este novo blog? O "velho" tinha olho clínico!
O "Jú", ou Geú, que como pura pegação é chamado por alguns, tem outro por dentro...e este outro parece ser um tantinho mais inteligente!
"Goxtêi, o xtepô tá ligado! (em 12v)!
Abs
Fábio
Luiz Fernando disse…
Eu não gosto de crônicas. Ou melhor gosto de algumas. Mas conhecendo a minha cidade (Esteio) e conhecendo o Juarez percebi muitas vedades em tudo aquilo que ele escreveu para o Jornal Eco dos Sinos. Embora o Juarez tenha ficado puco tempo entre nós, consegiu pela sua maneira peculiar de investigação (Doylle que me desculpe) de um quase um sherlock - assim mesmo com letras mínuscula para evitar egos inflados - perceber aspectos de nossa vida citadina que nos passam desapercebidos embora vivamos aqui.
E isso é um dom, é o olhar que encherga de outros prismas, que percebe nuances as vezes desapercebidas. Cara continue assim.

Fernando

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